Desabafo mental – vou escrever tudo exatamente como sinto,
sem me preocupar com o que possam pensar, rotular, deduzir, etc.
Por Carol Grechi
Duca Leindecker. Falar sobre meus sentimentos por esse cara
é difícil, mas ao mesmo tempo parece fácil, natural. Tudo que é absurdamente
simples acaba sendo complicado de se explicar.
Frase clichê, mais batida que minha canela, mas quando o
vejo numa foto, nos DVDs e nas poucas vezes pessoalmente, parece que já nos
conhecemos.
Claro que eu criei esse laço de afinidade, aprendi a tocar
violão vendo o DVD Cidadão Quem no Theatro São Pedro, todos os dias. Diversas
vezes. Ele virou minha companhia, na TV, nas músicas, na voz que se tornou tão
natural pros meus ouvidos como a da minha mãe, ou a do Greg.
A gente sempre acaba se impressionando com o que não entende
ou desconhece, né?... Houve uma época em que eu estava fazendo um trabalho de
vídeo sobre o Pouca Vogal, na faculdade de jornalismo. Eu via o rosto do Duca o
dia inteiro, editava, cortava, montava, via de novo, procurava em tal vídeo,
juntava, olhava de novo... E de novo...
Em três meses trabalhando com os vídeos, sonhei com ele umas
8 vezes.
Cientificamente entendo a lógica da influência visual nos
sonhos, mas, e as histórias dos sonhos?
Acordava me lembrando de tudo (geralmente a gente vai
esquecendo os detalhes) e pra garantir escrevia a história do sonho. Do
primeiro cheguei a fazer uns desenhos da cena, tipo storyboard.
Quando tive esse primeiro sonho, alguns lugares, situações e
pessoas que surgiam, pareceram normais, só parte de uma história que geralmente
não tem sentido.
Quando comprei os livros do Duca, após ler A casa da
esquina, o sonho passou a ter um sentido bem claro. Meio que uma mensagem.
Fiquei meio assim né, achando que tava imaginando coisas.
Quando vi o curta
“Chá de frutas vermelhas” (feito por ele) e reconheci uma locação e uma cena do filme
das cenas que eu tinha sonhado, aí me arregalei e arrepiei os cabelinhos do
braço.
Esse primeiro era daqueles em duas camadas, eu sonhei e
depois eu estava contando pra ele o que eu tinha sonhado, ainda dentro do
sonho. Os outros meio que seguiam a mesma linha, pessoas me reconheciam do
sonho anterior, a história continuava... Muito estranho.
Traduzindo as coisas, assim, em palavras, eu mesma leio com
olhos céticos. Fico buscando explicações, soluções lógicas, científicas,
Freudianas, isso é por causa disso e daquilo...
Mas, V S F, Carol cética!
Não quero saber o lógico, quero viajar no que eu imagino que
seja, na ligação invisível que eu sinto que existe. Não quero dizer que a
paixão é hormonal, quero acompanhar o romance.
Acho que tudo ficou ainda mais intenso nas minhas
caraminholas depois que vi o Duca pessoalmente num show, num lugar pequeno, em
Balneário Gaivota, e numa situação incomum.
Eu sempre, seeempre
fico em frente ao palco, pra realmente ver tudo o que tiver que ver. Nesse, eu
e meu primo chegamos bem cedo, ainda tinha lugares em frente ao palco, mas
ficamos dando umas voltas pelo lugar do show, pra matar o tempo e, quando
voltamos haviam ocupado o espaço em frente ao palco, em frente ao Duca.
Era um
moço numa cadeira de rodas, ocupava o lugar de umas quatro pessoas, e os amigos
dele ocupavam o resto daqueles poucos metros. Claro que não culpo o cara, mas
que fiquei meio assim, fiquei (ó, agora alguém me condenou ao inferno, lá fui
eu).
Tinha caminhado mais de 1 km pra chegar ali, minhas costas ardiam, chiavam
de dor durante a espera. Nenhum lugar pra me apoiar sem ser o ombro do coitado
do primo. Me agachei diversas vezes ao lado do cara, pra descansar as costas.
Ironia torta.
Então começou o show. Eu estava, digamos, na terceira
fileira da frente do palco pro fundo. Havia duas fileiras de cabeças na minha
frente. Durante o show não consegui despregar os olhos do Duca, literalmente. E
tive a impressão de que aquele par de globos castanhos também passava um bom
tempo na minha direção.
Até metade do show achei que eu estivesse delirando,
mas ouvi duas coisas. Meninas na minha frente: “parece que ele fica olhando
direto pra cá, né?”, aí a outra “é, mas não olha pra gente”. As duas viraram
pra trás e me pegaram ouvindo a conversa. Disfarcei e continuei cantando na
minha contemplação. Meu primo, depois de alguns minutos: “Ô, que tanto que ele
olha pra ti? Tu já conhece ele?”, falei que não, pensando que sim.
Definitivamente ele olhava pra mim. Podia ser pelo meu
chapéu com cara de turista, pela minha expressão congelada fitando ele, por que
me achou estranha, feia, bonita... Sei lá, mas que olhava, olhava. Tenho umas
duas fotos desse show, que bati do celular da mãe. Tosco, mas batia foto, o meu
não. O Celular tá ali estragado, as fotos lá dentro. Nunca consegui
descarregar. Mas quando a mãe viu as fotos, largou: “que legal, ele olhou pra
ti na hora da foto”.
***
Veio o segundo show.
Foi em Torres, na praia, “de grátis”! Fomos eu e Rafael, um
conhecido de Araranguá que comentou no Twitter que queria ir, mas ninguém
queria ir junto. Fechou! Eu tava no mesmo dilema.
Demos o azar de pegar o
ônibus mais cacareco de todos pra Torres. Ar condicionado? Pff... Nunca soube
calcular de que lado o sol ia ficar quando ele virasse pra direita ou esquerda,
acabamos indo no sol daqui até lá, nhaca de suor pegando. Pela janela
escancarada entrava um bafo quente do caramba.
Fomos bem cedo porque não sabíamos certinho onde era. Google
maps tinha sido a única ajuda. Pedimos informações pra um guarda na rodoviária
e achamos a tal da praça. Levei o Fred (Frederico Leindecker, meu violão) e
ficamos tocando até a hora do show.
A noite chegou e fomos nos postar em frente ao palco. Pra
garantir o lugar tivemos que ver uma dupla sertaneja, o show do Rui Biriva (que
foi muito massa, por sinal! Que Deus o tenha =/ partiu esse ano) e finalmente o
Pouca Vogal.
A droga é que o palco era grande e ficava a uns 10 metros da
grade que separava o público daquele vácuo. Não dava pra saber quem olhava pra
que lado. Era tudo “frente”.
Pedi a máquina do Rafa pra bater umas fotos. Depois do zoom,
não me espantaram os olhos castanhos encarando a lente.
Ah, porrax, esqueci dum baita dum detalhe na ordem
cronológica da coisa toda!!! Volta a fita.
Antes do show, eu e o Rafa ficamos perto da saída do palco,
porque deduzimos que uma hora eles viriam passar o som e seria um bom momento
pra fotos e autógrafos.
Estávamos ali quando vimos o Humberto chegar e subir ao
palco. Eu fiquei olhando em volta da escada, procurando pra ver se ele chegava.
Tava ali com aquela expressão nítida de procura na testa, quando me deparei com
um cara olhando pra mim, perto da escada.
Um cara alto, bem alto, de barba, cabelo mais comprido...
Peraí, porque ele ta me olhando e começando a rir? Ah não... É ELE! Claro que é
ele! Ali, ali! Depois da curva na areia, bem na minha reta, me encarando! Como
eu não vi??
Obvio que entendi a risada, ele riu da minha cara. Minhas
expressões são muito claras (às vezes isso me ajuda, às vezes atrapalha).
Olhando pra mim ele deve ter imaginado um letreiro luminoso com três fases sob
a minha cabeça.
Fase 1 - PROCURANDO – Cara óbvia de que tava procurando
alguém, olhando as pessoas por cima, as entradas, saídas, o palco...
Fase 2 - ESTRANHANDO – As sobrancelhas encurvadas, os olhos
apertados pra enxergar melhor, o cérebro procurando pela informação de quem era
aquele rosto..
Fase 3 - RECONHECENDO – Meus olhos se arregalando, a boca
abrindo feito um peixe abobado, a mão tateando às cegas, tentando encontrar o
Rafa pra confirmar, mas sem a ajuda dos olhos, que como sempre, continuavam
pregados no cara alto e barbudo que agora ria abertamente.
Depois que ele olhou pra outro lado, o Rafa fez uma breve
análise e confirmou. Sim, era o Duca Leindecker.
Puta merda, que situação. Bem a minha cara.
Ele subiu as escadas pra passar o som e, quando desceu,
tomei coragem. Fiquei encarando até ele olhar, imã certeiro. Ele virou e eu fiz
sinal com a máquina e o livro. No topo da minha cabeça devia estar aparecendo
POR FAVOR.
Ele veio.
- Oi Duca, tu pode me dar um autógrafo?
- Claro.
Ele autografou “A casa da esquina”.
- Tu tira uma foto comigo?
- Sim.
O Rafa foi pra nossa frente, demos um meio abraço e ficamos
esperando o flash com um sorriso engatado. Mas nada do flash. Parecia aquelas
pegadinhas do Serginho Groismann, do “mas é vídeo, não é foto”.
O Rafa falou “ela demora um pouco...” E já ia baixando a
máquina quando saiu o flash.
Nem preciso dizer que o sorriso dele já tava na fase de
desmanche quando a foto deu certo. O meu ainda tava lá. Sempre está.
- Bah, obrigada – disse a Carol olhando pra cima, virada em
dentes.
- Capaz... Que bonita tua camiseta. – (era do Pouca vogal,
eu tinha pintado pra esse show)
- Brigada! Fui eu que fiz.
- Sério? – questionou ele se inclinado um pouco pra ver
melhor as letras pintadas.
- Aham. Tem atrás também – respondi toda orgulhosa, me
virando e tirando o cabelo das costas.
- Que legal, parabéns, tá bem bonito.
- Obrigada.
- Bom, eu vou indo.. tchau.
- Tchau, bom show...
Bah. Também tirei foto com o Luciano, bem querido. E mais
tarde com HG. O Rafa também.
Depois disso veio o show. (cronologia na história, nota:
zero uaheuaheuahe)
***
Terceiro show.
Florianópolis, Floripa Music Hall. Fomos eu e meu amigo
Félix. Armados de câmera fotográfica e filmadora, chegamos cedo, e garantimos o
meu tão esperado lugarzinho de cara a cara com o Leindecker.
O show começou, Humberto foi sentar-se à direta do palco e Duca
Leindecker sentou-se à minha frente, há uns dois metros do meu alcance. Eu
sorria quando ele me pegou encarando-o. Ele ficou me olhando e deu um leve
sorrisinho. Pisquei algumas vezes, achando que tinha imaginado a cena e
entendido um reconhecimento discreto.
Filmei boa parte do show, quase todo, por que as imagens
eram justamente praquele trabalho de vídeo que eu estava fazendo. Preciso dizer
aonde o zoom corria mais? Hehe.
Antes do show pedi pro Félix prestar atenção e dizer se
realmente ele olhava pra mim ou era impressão minha. Na metade do show ele veio
no meu ouvido e confirmou, “Sim, ele olha diretamente pra ti e desde que
começou o show”.
Os vídeos pegam umas três das olhadelas, pra um ponto logo à
esquerda da lente da câmera. Eu.
Teve uma hora que foi engraçado, me senti na escola de novo.
Eu tava curtindo o cabelão do Humberto e quando olhei pro Duca de novo ele me
encarava com uma intensidade que me desconcertou. No reflexo baixei os olhos e
fiquei vermelha. Eu literalmente senti o calor do sangue nas bochechas. O que
era aquilo, meu pai?? Desde a terceira série eu não corava.
Depois dessa voltei a olhar pra ele e, quando ele olhou pra
mim começamos um jogo do “quem desiste primeiro”. A fixação mútua foi longe, os
olhos demoravam a piscar... Não lembro quem ganhou.
Enquanto a gente tava ali naquela ligação eu falava em
pensamento “por quê? Tu sabe por quê? O
que tu tá pensando agora? Por que tu me olha? tu lembra da minha cena cômica em
Torres? Do show na Gaivota? Tu me olha porque acha que lembra mas não sabe de
onde/quando? ou tu também sabe que tem uma coisa estranha rolando?”
Só Deus sabe o que ele pensava.
A Carol cética tá dizendo que ele olhava direto pra mim
porque era o ponto de descanso automático dos olhos dele, logo abaixo e a frente
(então porque na Gaivota descansaria os olhos alguns metros atrás desse
ponto?). Ele devia estar olhando mas não olhando, pensando na música, no que
viria a seguir. Devia olhar sem querer...
Não, sem querer não. Agora tu me desculpa, Carol cética. A
gente sabe quando uma pessoa olha pra gente porque quer olhar. (Agora no
notebook ele cantou “Olha aqui pra mim, Quero olhar, pra você. Ah, não desvia o
olhar, onde você vai? eu esperei, pra te ver” na música Do outro lado da rua.
Agora vai, explica. ¬¬ Coincidência? “Sei que a vida continua, mesmo que você
não... Você não saiba nem quem sou eu, alguém que um dia apareceu”).
Bah aí me quebra né, tocar essa frase, dessa música, justo
agora. Eu tava ouvindo cidadão até agora, trocentas músicas, e cai essa bem na
hora. Vai Carol cética, usa a desculpa da coincidência, vai.
Voltando ao show de Floripa, quando estávamos voltando pra
casa, o Félix comentou: “Olha que se eu fosse o tio Gregório (Greg) ali do teu
lado, tinha me mordido de ciúmes. Ele te olhou o show todo, sua lisa!”. Pois
agora, migolino.
***
Quarto show.
Greg teve a oportunidade de se morder de ciúmes.
Fomos à Meleiro, eu estava trabalhando na Atlântida Criciúma
e o Sandro, do comercial da Atlântida Joinvile, me achou na internet e
perguntou se eu queria ingressos.
Será que queria? Hehe.
Nos conhecemos lá no dia do show, ele nos entregou os
ingressos e ficamos conversando. Sabe quando tu começa a conversar com uma
pessoa como se fosse natural? Os assuntos vão surgindo, o interesse é sincero e
mútuo... Ele até convidou a gente pra ir pra Joinvile, o Greg de cinegrafista e
eu na rádio, hehe, gente fina.
Quando entramos fomos lá pro já clássico lugar à esquerda do
palco, em frente a ele.
Pelas tantas, vi o Sandro me chamando ao lado do palco. Pedi
pro Greg guardar lugar e fui até lá. Ele disse que não tinha ninguém pra chamar
as bandas ao palco, se eu não gostaria de fazer esse favor. Dá licença pela
expressão, mas, me caguei toda.
Dei umas três piscadelas com a boca aberta, naquela cara de
peixe abobado, e falei que sim.
Ele disse que era pra eu me apresentar, agradecer ao
público, etc., e chamar primeiro o show da Nove de Espadas e, depois o do Pouca
Vogal.
No embalo perguntei se depois do show ele achava que eu
conseguiria tirar uma foto com eles...
Ele me olhou e disse:
- Claro que sim, mas vamos agora, que eles já vão embora
depois do show.
Bah! Subi pelo palco e peguei os livros e DVDs com o Greg,
também a máquina e canetas.
Entramos tipo numa salinha, estava o pessoal da Nove de
Espadas, super queridos, tiramos fotos também e ganhei um CD deles =)
Depois fomos pra outra porta, quando entrei vi que era tipo
uma cozinha, estavam o Humberto, o Luciano e, claro, o Duca.
O Sandro me apresentou como sendo “a Carol da Atlântida
Criciúma”, se poderiam tirar um foto comigo, e tal. Falaram “Claro, claro”.
Foi estranho, só eu ali com eles. Distribui as canetas e
DVDs pros três.
- Carol, né? – perguntou o Duca com um dos livros na mão.
- Aham.
Depois de tudo autografado, entreguei a máquina pro Sandro e
me posicionei entre o Duca e o Humberto. Os braços dos dois cruzaram as minhas
costas e os meus levemente às costas deles. Luciano ficou ao lado do Duca.
Agradeci mais uma vez, Humberto falou sorrindo “capaz,
capaz”, mas os irmãos Leindecker estavam sérios.
Quando voltei, entreguei as coisas pro Greg e fui pro palco
chamar a Nove de Espadas.
Depois do show esperei o sinal do Sandro e fui pra chamar o
Pouca vogal. Lembro das palavras que eu fiquei ensaiando ao lado do palco.
“Boa noite, galera. Esqueci de me apresentar antes, né? Sou
a Carol, da Atlântida Criciúma. E Bom, obrigada pela presença de vocês, eu sei
que pra sair de casa com esse frio que tá hoje, todo mundo aqui deve curtir
muito a Cidadão, o Engenheiros, e agora esse projeto do Duca Leindecker e do
Humberto Gessinger, o Pouca Vogal. Com os últimos acordes do showzaço da Nove
de espadas ainda ecoando aqui no Clube Sapiranga, chegou a hora. Com vocês,
Pouca Vogal!”
Ah, foi mais ou menos isso, o Greg filmou, mas escrevi o que
me lembrei de cabeça, depois vejo se era parecido.
Mesmo com o namorado ao meu lado, os olhares estavam lá. Em
menor número, confesso, mas estavam lá. Ele começou o show bem sério, mas
depois o pessoal cantava tão alto e tão forte que ele foi indo ao habitual
estado risonho.
Fiquei pensando se ali em frente ao palco ele se lembrou dos
outros shows ou se é muito rosto e nome pra se lembrar de alguém.
Antes de acabar o show olhei pra ele e esperei o imã agir,
quando ele olhou falei devagar “palheta” fazendo a mímica de tocar violão. No
topo da minha cabeça a expressão deve ter acendido o POR FAVOR outra vez.
Ele sorriu e fez que sim com a cabeça enquanto acompanhava a
música.
Quando acabou, ele e o Humberto agradeceram ao público e ele
veio na minha direção. As mãos se atulharam em volta da minha, mas a certeza do
trajeto trouxe a mão dele exatamente pra minha. Ainda me lembro do toque, do
sorriso e da leve pressão nos meus dedos antes de nos soltarmos, ele deu um tchauzinho
pro público e foi lá pra trás com o Humberto. Da hora em que ele levantou e
veio caminhando até quando nos soltamos, foi questão de segundos. Eternos
segundos.
***
Tive que agüentar a cara engraçada do Greg me olhando de
esguelha com os olhos estreitos, e falando: Quê que vocês demoraram pra soltar
as mãos, hein? E por que ele ficava olhando pra ti? Hum... Não se engraça com a
minha mulher que eu to de olho, Leindecker.
O sorrisinho dele tentando falar isso sério me fez rir,
hehe. Nessas horas que agradeço pelos nossos cérebros cabeçudos se comunicarem
tão bem, ele falou isso porque não ia perder a chance de fazer a cena clássica
do ciúme, e já me disse que realmente tem ciúmes do Duca, mas também já me
disse que entende a importância da “coisa toda” pra mim e que respeita isso.
Como não amar? ^^
***
Vamos pra internet, então. As três vezes em quem menos de
140 caracteres me fizeram sorrir por um bom tempo. Tá, ainda fazem.
No começo de 2010 (eu acho) entrei no Twitter e, depois de
procurar pelos colegas e conhecidos, qual o nome que joguei na busca? Duca
Leindecker.
Apareceu uma página, no avatar uma foto que não mostrava o
rosto, poucos seguidores, uns 15 e seguindo uns 15 também. Na timeline só uma
frase: Entrei.
Pra mim foi o suficiente pra autenticar o perfil. Segui.
Dois dias depois aquele e-mail de atualização do Twitter que
cai no meu Hotmail:
@DucaLeindecker
now is following you.
Bah! O Duca me seguindo! Me inflei de orgulho UAHAUEHAUEAUH
Lá pelas tantas de março, dia 25, escrevi:
“Baixando de novo o curta do @DucaLeindecker, ‘chá de frutas
vermelhas’... tá em 72%... Acho que agora vai... o/”
Isso porque era a terceira vez que eu tentava baixar, sempre
dava erro.
No mesmo
dia, tweet retweeted by @DucaLeindecker
Dois dias depois ele me respondeu.
“@CarolGrechi Ok, mas vou disponibilizar o filme para
download no 4share pra ter mais qualidade. Depois aviso. Valeu”
Bah. Bah e bah!
***
Quando eu estava trabalhando em Jacinto Machado, numa rádio,
ia sempre à Lan House/locadora de vídeo. Devo ter enriquecido o cara, porque
não tinha mais nada pra fazer naquela cidade. Eu ficava viajando no Twitter e
alugando filmes.
Um dia recebi a notícia de que estava desempregada. Saí da
rádio, fui ao banco, liguei pro Greg, pra mãe, e fui à Lan House.
Não tava curtindo muito o emprego, mas, a grana era boa e eu
tinha que juntar pra pagar a formatura... Deu um baque do caramba...
Mesmo já tendo visto, procurei o link da segunda Twitcam do
Duca, em que ele tocava com o Luciano. Enquanto via e, às vezes só ouvia,
escrevi:
“Vou ver agora a Twitcam do @DucaLeindecker pra ver se
alegro... desempregada há alguns minutos, hehe.”
No mesmo minuto ele me confortou.
“Vai dar tudo certo. RT @CarolGrechi Vou ver agora a Twitcam
do @DucaLeindecker pra ver se alegro... desempregada há alguns minutos, hehe.”
***
Em maio fui à Porto Alegre entrevistar o David Coimbra pro
meu TCC sobre jornalismo literário.
Estava sentada em frente à Zero Hora com a
mãe, esperando o meu amigo Rafinha chegar. Um taxi parou em frente ao prédio e
uma mulher toda bonita saiu. Com o celular na mão, ela ficou parada uns 3
minutos na calçada. Fiquei olhando e, depois de alguns segundos comentei com a
mãe (até meio em voz alta, inocentemente indiscreta) “ó, é a mulher do Duca, a
Ingra Liberato”. Se ela ouviu, disfarçou bem. Deduzi que devia estar tuitando
antes de entrar.
Na mosca. Depois vi no Twitter que ela havia postado que
estava em frente à Zero Hora e que tinha uma entrevista numa das rádios do
prédio, ou alguma coisa assim.
No dia seguinte eu tava na casa do pai, em Estância velha,
curtindo um som no fone de ouvido, todo mundo já estava dormindo...
Comecei a pensar no quanto gostava de visitar Porto
Alegre... E escrevi:
“Antes de eu morrer quero tocar violão com o @DucaLeindecker.
Até mesmo porque depois fica meio difícil, hehe.”
Na hora ele mandou lá de Foz do Iguaçu, antes de um show do
PV:
“Acredito em tudo! RT @CarolGrechi: Antes de eu morrer quero
tocar violão com o @DucaLeindecker. Até mesmo porque depois fica meio difícil.”
Putz. Será que dormi feliz?
***
No dia 23 e março de 2011 eu pedi a internet móvel do Greg emprestada, saí da aula mais cedo
e fui pro ônibus no estacionamento da faculdade. Conectei (santo 3G, Criciúma)
e assisti à primeira Twitcam do Duca.
Eu já havia marcado a data pra não
esquecer e fazer toda essa “operação internet”... Durante a semana eu pedi pelo
Twitter a música “A rua e Sol”. Ele não respondeu, mas disse que estavam
chegando pedidos legais.
Já no final da Twitcam, ele disse “essa música é bacana, é
bem antiga essa música, se chama “A rua e o sol”... A anterior foi
‘Instantâneo’... Começa assim...”
E instantaneamente reconheci o primeiro solinho no violão...
Era a minha música. Fiquei toda boba no ônibus, aumentei o volume nos fones e
fiquei suspirando... Ele tocou a que eu pedi...
***
(vou abrir dois parênteses, este, pequeno, pra anunciar...)
(... E Este, bem grande, pra explicar. Sempre estudei de
manhã. Quem conhece os invernos de Novo Hamburgo sabe o que é acordar e sair
das cobertas em direção ao ar gelado. Minha mãe sempre me vestia o uniforme da
escola antes de dormir, pra não passar frio trocando de roupa no dia seguinte.
Meus pais já estavam separados.
Às seis da manhã eu
saía até meio dura de tantos casacos.
Voltava suando, pegando o Sol do meio dia, que deixava aquele ar irônico
no amontoado de casacos dobrados nos braços e na mochila. Lá em Novo Hamburgo
minha mãe me levava de ônibus pra escola, pois trabalhava ali perto. Quando nos
mudamos pra Santa Catarina, passei a fazer o trajeto sozinha.
Na rua em que moro existe uma casa amarela, na esquina da
nossa quadra. De manhã passava por ela e levava apenas o perfume das flores,
cujo nome só fui conhecer a pouco. Na volta, pensando no que a mãe haveria
feito pro almoço, eu sempre parava em frente à casa da esquina pra juntar uma
das flores, às vezes duas, cheirar e levar pra casa pra perfumar o almoço.
Quando eu estava triste, parava por mais tempo e ficava um pouco sentada no
muro baixo... Ficava decorando o desenho das flores, a forma com o branco das
pétalas iam se fundindo com o amarelo no centro... O perfume que me fazia
suspirar incessantemente e apagava do meu pensamento o que quer que me
incomodasse.
Quando li “A casa da esquina” me perguntei se o Duca seria
meu eu masculino na infância. Ele ia pra escola de manhã, cheio de casacos, em
Porto Alegre, e voltava suando ao meio-dia. Passava por uma casa de esquina e
as alças da mochila arrastavam as flores perfumadas. Às vezes ele também parava
na casa da esquina, pra pensar, sentir as flores. No livro ele diz que o nome
da flor é “Primavera”. Um tempo atrás, Duca postou uma foto no Twitter com a
seguinte legenda: O cheiro da minha infância. Preciso dizer que eram as mesmas
flores?).
***
Se tem uma coisa que sempre funcionou muito bem nesse meu
cabeção foi a imaginação.
Já perdi as
contas de quantas vezes me imaginei tocando violão com o Duca, vendo ele cantar
ali de pertinho, cantar com ele, ver ele me ouvindo cantar... Conversarmos
sobre música, sobre os sonhos, sobre qualquer coisa... Quantas vezes me
imaginei numa amizade com o Duca, o Luciano, o Humberto...
Encontros ao acaso, salvamentos heróicos, amigos em comum
que nos apresentavam... Histórias mirabolantes, de invejar os roteiristas de
Hollywood. Te cuida, Cris Nolan!
No início da tarde, um pouco antes de começar a escrever
– agora são 21:55 - eu tava ouvindo uma seleção com as minhas
músicas preferidas de todos os CDs da Cidadão e, olhando as fotos que tenho
dele, dos shows... Em cada uma eu vi mais do que apenas olhos castanhos
encarando a lente.
Eu vi uma linha imaginária, eu vi as palavras que nunca
trocamos com os lábios, mas, que os olhos conheciam muito bem. Não gritei o
nome dele histericamente, não me joguei no chão desmaiando de emoção, não
gritei “liiindoooooo” como as que já arrebentaram meus tímpanos nos shows.
Trocamos poucas palavras, mas sempre conversamos em cada show. Entendemos a
intensidade dos olhares fixos, imaginando os motivos um do outro, presos por
nós mesmos nessa linha que nos une.
Vai chegar o dia em que vamos nos conhecer como se deve. Não
com a distância do artista pra admiradora, mas, com a liberdade de duas pessoas
curiosas pela opinião do outro, dispostas a ouvir, falar, conversar, criar
música, amizade, parceria... Respeito.
É
isso que imagino nas minhas histórias mirabolantes, situações impossíveis que
levam sempre a esse desejo.
Não sei se esse dia vai chegar em breve, daqui a muito tempo
ou em outra vida.
Eu também acredito em tudo, Duca. Sei que além do que
vivemos houve um antes e sempre haverá um depois. Estarei sempre à espera desse
dia e de tudo que virá depois dele.
Por enquanto aguardo relembrando o que só nós somos capazes
de entender, mas espero em paz, pois, eu sei que “À medida que o tempo passa,
vamos nos adaptando a novas realidades e percebendo o real valor de tudo que um
dia nos foi dito. Até as coisas mais absurdas apresentam algum significado com
o passar do tempo. O tempo dá condições para que possamos compreender, nos dá a
distância para que possamos enxergar o que de perto é, quase sempre,
invisível.” (A favor do vento, p. 18, Duca Leindecker, 2002)
A mola na ponta da caneta acompanha as batidas do violão que
eu ouço no mp3. Sou eu tocando e cantando. Quer dizer, agora acabou a música e
o Duca Leindecker canta que suas lágrimas não caem mais, pois ele já se
transformou em pó.
Penso quando vou voltar a compor. Sinto falta da empolgação
e da caça pelas palavras certas. Mas quando penso que quero escrever, que tenho
que escrever, só me vem o silêncio. Como eu tenho fé na força do silêncio, é só
continuar esperando.
Ainda é dia, mas as luzes dos postes já estão acesas. O Sol
já vai dormir nesse entardecer frio de domingo.
Acabou a faculdade, acabou meu dinheiro, acabou o dia.
Enquanto a noite se espreguiça antes de começar, começo a pensar no que virá,
como pagar, onde morar.
Olho ao redor e vejo as pessoas descendo e subindo, indo e
vindo. Sobem com as mãos no bolso, dinheiro também, a lista das compras da vida
de alguém. Descem devagar, enquanto a escada rola, as mão ajeitam as sacolas, o
olhar desfocado sente a falta dos ex-trocados.
Café, panqueca, pastel, sanduíche ou pizza? Hoje o meu prato
é a folha em branco. Barata, não engorda e distrai um pouco.
Espero o meu amor. Não de uma maneira filosófica,
literalmente mesmo.
Acabou de chegar. Os olhos verdes que me mostram os caminhos da noite.
Imaginar. O que seria de nós, meros mortais, sem a capacidade de criar um mundo em que tudo é possível? Vamos ser sinceros, todo mundo um dia (como diria a canção de Diego Floreio, interpretada por Mr.Pi) já imaginou coisas sobre certas pessoas... Coisas que jamais sairiam pela sua boca, mas que entraram voando pela sua nada inocente mente...
Tirem as crianças da sala, pois vamos cair no que interessa. O papo de quem já sabe que a cegonha não traz bebês porque está ocupada fazendo cegonhinhas com o Seu Cegonho (tá, Word, sei que essa palavra não existe, mas deixa eu imaginar que sim...).
Um amigo dum amigo meu me contou que esses dias estava conversando com um casal de amigos sobre os famosos cobiçados... A brincadeira era listar três pessoas famosas, digo, inatingíveis, com quem os dois tinham pensamentos pecaminosos.
Tá bom, o cinema apela né... Os olhos grandes e negros do Downey Jr, inteligentemente charmosão de Sherlock Holmes, heroicamente atraente de Homem de Ferro... (garanto que citei o último personagem sem malícia)...
Hugh de médico genial, olhos azuis, barba por fazer, um humor inteligente disfarçado de mau-humor, uma carência escondida pelo Housismo irônico que lhe corre pelas veias e que além de tudo é um músico admirável...
E o Leindecker de próprio representante da música, olhos cor de avelã, traços que passam de seriamente atraentes a aconchegantemente acolhedores ao abrir seu sorriso perfeito, ladeado por covinhas, enquanto sola em sua guitarra, canta com sua voz suave e... Além de tudo, também nos prende com seu texto de ótimo escritor.
Ah, Jessica Alba, faça-me o favor né minha filha! Seja um pouco mais feia pra não nos desanimar... Parece que foi desenhada com uma régua, simetricamente perfeita, desumanamente linda... Assim não vale...
Monica Belluchi, desculpa querida, mas não sei o que o cara amigo desse amigo meu viu em você... Aos meus olhos vejo só sedução na forma de uma mulher, mas só sedução não é predicado suficiente pra mim... Foi mal, se fosse homem te trocaria por um clone da Jessica Alba.
Eva Mendes, tu é outra que tem que enfeiar bastante pra chegar ao nível das meras mortais. Pele “cor de cuia” como diriam os antigos, sorriso destruidor de tão bonito, olhos negros, seu sangue latiiiiiinooo (diria Seu Nei Mato Grosso)... Sinuosamente desleal... Sua chata, abobada...
Agora diz aqui pra mim, caro leitor que finge não ter pensamentos calorosamente impuros, no mundo real, quem faz teu sangue ferver? (expressão de novela mexicana, né?)
Diz aí, quem no teu trabalho te faz dar uma segunda e maliciosa olhadela, am? Alguém ou “alguéns” da faculdade... Aqueles ou aquelas que te fazem agradecer pelo fato de os pensamentos serem agradavelmente silenciosos...
Exceto no caso de alguns pedreiros, mestres em levar aos lábios rapidamente seus pecaminosos pensamentos ao ver uma donzela cruzando seu caminho em frente à obra... Pelo menos não são hipócritas que fingem dar atenção aos seus olhos numa conversa, quando você sabe que atenção sempre, sempre está alguns centímetros abaixo.
E os bobinhos hipócritas acham que não existem bobinhas hipócritas... Talvez o time das meninas finja melhor...
Antes que algum padre, freira, senhor ou senhora conservadores, o editor chefe ou algum mala de plantão venha reclamar e/ou me condenar ao inferno, vou terminando a crônica por aqui. Inocentemente indo dormir e não sonhar com alguém sem roupa.
Alô, dona de casa! Está passando na sua rua o carro da pamonha... Pamonha, pamonha, pamonha...
Alô, criançada! Está passando na sua rua o carro do picolé... [trilha sonora] “Brincadeira de criança, como é bom, como é bom...”
Alô, desempregado! Está passando na sua rua o carro das frases de auto-ajuda... São quatro frases por apenas um real! “Não desista”, “você é capaz”, “a culpa nunca é sua”, “Pelo menos você está vivo” e muito mais! Aproveite! São quatro frases por apenas um real... [trilha sonora] “Weeeee... Are the chaaaampions, my frieeeend...”
Pois é “leitorinhos” (como diria meu muso literário inspirador, David Coimbra)...
Um amigo dum amigo meu perdeu o emprego esses dias e resolvi escrever sobre o caso dele. O Bob (que era conhecido assim por ter um baita dum cabeção, tipo o do personagem daquele desenho do Fantástico mundo de... De... De quem, mesmo?) era um trabalhador comum, com sua vida comum e seus problemas comuns. O que tornava Bob diferente era um detalhe que às vezes nem ele mesmo entendia.
Bob tinha um grande coração (além de um grande cabeção) e isso fazia dele alguém diferente.
As pessoas que trabalhavam com Bob em seu emprego comum também eram incomuns. Eram todas engraçadas, inteligentes, competentes, bonitas, às vezes irritantes, mas, em sua maioria pessoas simplesmente apaixonantes.
Estar na companhia destes colegas fazia as tardes parecerem mais longas, as noites mais bonitas e o barulho do crachá/ponto eletrônico parecer mais afinado em seu apito diário às 14:00 (às vezes 14:20, quando Bob perdia o ônibus...).
Bob sempre esperava ansioso pelo dia seguinte, imaginando quais seriam as piadas da vez, as músicas da vez e as histórias da vez na redação. Ah, sim, falei que Bob trabalhava em jornal? Aham, um jornal muito bom, por sinal...
Um dia, quando uma semana excepcionalmente divertida no trabalho chegava ao fim, Bob percebeu algo diferente. Seu chefe, que era muito querido, estava estranhamente estranho. Redundantemente bravo/esquivo/triste e anormal. No meio da tarde Bob descobriu o porquê.
Queria não ter descoberto, queria ter reprisado as primeiras horas daquela tarde de sexta-feira, como um disco arranhado na melhor frase da música... Um repeteco eterno pra que ela não precisasse nunca chegar ao fim.
Mas chegou. A música, a tarde, a razão do chefe não estar sorrindo. Chegou a notícia (nada mais justo, em um jornal) de que Bob estava demitido.
Aliás, “sua saída havia sido pedida”, por motivos que o pobre Bob julgou não serem justos, mas, sendo o jornalista que era, sabia que naquele momento seu julgamento estava obviamente sendo imparcial devido às circunstâncias, o que não o permitia analisar o caso com clareza.
A verdade é que não havia nada a ser analisado. Lutar contra uma demissão é como tentar nadar sem saber nadar. Você pode até se esforçar pra fazer seus argumentos boiarem por um tempo, mas depois você enfraquece e afunda no infinito mar do “quem manda mais”.
Bob descobriu porque seu patrão outrora querido estava tão bravo. Ele estava triste por ser o portador da notícia, por reportar o adeus ao seu funcionário. Estava fazendo seu papel numa peça onde o autor esquecera de escrever o resto das falas de Bob.
A menos que as fungadas e soluços sejam consideradas palavras, o silêncio caiu como uma pedra na garganta do emotivo e cabeçudo Bob. Abraços dos colegas de quem ele mais gostava faziam o jornalista não entender o que estava sentindo.
Depois de muitos minutos lavando os olhos vermelhos no banheiro, conversando com um cara lá de cima que só podia estar de brincadeira, se perguntando como pagar a prestação que vai até março do ano que vem... Bob respirou fundo (o mais fundo que seu nariz congestionado permitiu) e decidiu terminar aquele dia triste deixando uma lembrança boa na mente de cada colega.
Bob havia comprado duas barras de chocolate no dia anterior e guardado par dividir com os amigos na sexta-feira em questão. Com o coração ainda resmungando, Bob partiu uma das barras em inúmeros quadradinhos e as colocou em sua caneca preferida, que sempre deixava no jornal.
Outra coisa que sempre lhe acalmava no trabalho era uma bolinha vermelha, dessas de espuma, que a gente aperta quando sente que o braço está doendo ou quando sente que quer matar o repórter que escreveu um texto tão ruim “que é de cair o c.. da bunda”.
Bob pegou a outra barra de chocolate, a bolinha vermelha, e colocou ambos na mesa de seu chefe querido, que lhe fitou com um meio sorriso pesaroso. A caneca com os quadradinhos de chocolate foi passeando pela redação, enquanto Bob tentava deixar em seus colegas pelo menos uma última lembrança doce de sua presença.
Aliás, a caneca (também vermelha) foi posta sob a mesa de um colega com quem Bob estava se identificando cada vez mais, e que talvez lhe viesse a ser um bom amigo. O colega sorriu e agradeceu, minutos antes de postar uma foto da caneca no Facebook.
Depois disso as ondas de tristeza/verdade iam e voltavam, e uma coisa começou a incomodar Bob fisicamente, mas ele não distinguia o que era.
A noite, em casa, às 2:40 da manhã, sem conseguir dormir, com os olhos inchados de choro, com uma saudade antecipada dos colegas que não mais veria, com a lembrança de cada abraço e cada lágrima disfarçadamente derramada por ele... Bob foi invadido por uma paz triste de quem finalmente compreende. O que ele estava sentindo, era dor.
Não uma dor que se pode apontar com o dedo, não uma dor que passa com Aspirina...
Uma dor invisível de alguém que durante dois meses foi simplesmente feliz por ter uma vida comum, em um emprego comum, ao lado de pessoas que lhe causavam das mais variadas formas um indescritível contentamento diário em meio às notícias. Antes de tentar dormir, eu soube que o Bob, esse amigo dum amigo meu, desejou com todas as suas forças, com toda a graça de suas piadas sem graça, com toda sua inteligência de pessoa cabeçuda, com toda sua carência de alguém com coração molenga... Ele desejou humildemente que seus colegas não o esquecessem... E desejou sinceramente poder escrever um dia uma crônica tão boa quanto esta, pois, ele nunca irá desistir, ele sabe que é capaz, sabe que a culpa nunca será dele, sabe que pelo menos está vivo... E tudo isso, por apenas um Real.
Há quem faça contas Há quem vá as compras Quando mais um ano chega ao fim Hora de escrever cartões Hora de rever os planos Mais um ano chega ao fim
Quem venha em paz O ano que vem Que venha em paz O que o futuro trouxer
Cai a neve na vitrine E a gente derrete ao sol Neste natal tropical Os cachorros da vizinhança vão latir Sob fogos de artifício Pensarão que é o fim Mas será só o início
Quem venha em paz O ano que vem Que venha em paz O que o futuro trouxer
Há quem ignore o calendário Há quem fique de olho no horário Quando mais um ano chega ao fim Quem venha em paz O ano que vem Que venha em paz O que o futuro trouxer
Novo Hamburgo, Escola Otávio Rosa, terceira série, 1997. Carol e Felipe era amigos inseparáveis. Ela CDF, quietinha e às vezes distraída. Ele bagunceiro, notas baixas e da “turma do fundão”. No recreio ambos iam contra suas definições e saíam abraçados pelo pátio da escola, cantando Mamonas assassinas e parando sempre em determinados pontos pra comentar as lendas da escola, como a do menino que jogou uma pedra de brita na parede do parquinho, a pedra voltou, o acertou na fonte e ele morreu. Frequentemente os dois paravam em frente a tal parede e permaneciam alguns segundos em silêncio, em respeito ao morto que provavelmente nunca existiu.
Os dois passavam tanto tempo juntos que Carol começou a perceber detalhes estranhos em Felipe. Como ele era bonito. Talvez o mais bonito da sala. Ou o mais bonito da escola. Como ela nunca havia notado isso antes? De repente passou a ser algo tão óbvio... Seu melhor amigo era simplesmente lindo. As festas juninas se aproximavam e Carol começou cada vez mais a se incomodar com seus sentimentos estranhos para com Felipe. Com oito anos era a única definição possível, “sentimentos estranhos”.
Inspirada nos romances tortos da Sessão da tarde e nas histórias de contos de fadas, Carol tomou uma decisão. Não podia mais passar a manhã com seu amigo sem que quisesse passar o resto do dia com ele. Iria escrever uma carta.
Armou-se de sua caixa de 24 lápis de cor da Faber Castell, algumas folhas de ofício, lápis, borracha e cola. Escreveu a mais apaixonada das cartas que uma criança de oito anos é capaz de escrever. Como direito a “eu amo você” (como havia visto na Sessão da tarde), desenhos de um casal de mãos dadas que lembravam vagamente as feições de ambos, corações vermelhos com “Carol e Felipe” dentro, e a pergunta que mais pesava na cartinha: Quer namorar comigo?
Fez um envelope, lacrou com um adesivo e escreveu atrás num cantinho: “De: Carol - Para: Felipe”.
Na manhã seguinte foi para a festinha junina, de vestido de chita, trancinhas, sardinhas e tudo mais. Na mochila, a carta que ditaria o futuro das suas férias de julho de 97.
Esperou a hora exata em que Felipe não estivesse perto de sua mesa e foi até lá. Deixou a carta em cima do caderno do amigo, numa grade logo abaixo do tampo da mesa. Saiu com as mãos ainda tremendo e enquanto esperava a resposta, foi brincar com as colegas e comer pé-de-moleque.
Pelas tantas da festinha, o som parou. Quando Carol levantou os olhos deparou-se com a seguinte cena: Um colega que concorria com Felipe no cargo de mais bagunceiro, havia encontrado a sua carta. Mais do que isso, estava de pé na cadeira de Felipe, com a carta aberta. Então ele começou a ler.
Cada palavra, cada “Felipe eu te amo” ficou ecoando pela sala. Antes da visão de Carol ficar completamente embaçada pelas lágrimas de vergonha, ela viu seu amigo Felipe encarando o colega torturador com uma expressão muito séria. A expressão mais séria que uma criança de oito anos pode ter.
A professora resolveu fazer alguma coisa e tomou a carta do aluno, ligou o som novamente e foi tentar consolar a prenda mais chorona de toda a história das festas juninas.
Sentada no chão, abaixo do quadro negro, Carol abraçava os joelhos e só ouvia murmúrios das amiguinhas lhe dizendo que ia ficar tudo bem, que o colega idiota estava indo pra direção... Mas nada disso interessava. Até que ela ouviu a única voz que importava naquela hora.
- Carol?
Ela abriu os olhos e viu seu amigo/amor ainda sério, lhe estendendo a mão. Ela a tomou e se deixou guiar. Entraram engatinhando em um “corredor”, formado pelos pés das mesas de quitutes, encostadas à parede. Ali estavam a salvo dos olhares do resto da sala, protegidos pelas toalhas de mesa que pendiam moles, banhadas por refrigerantes derrubados.
Felipe segurou uma das mãos dela e disse:
- Carol, eu gosto muito de ti. Muito mesmo. Mas é só como amigo... Nós ainda podemos ser amigos?
Ainda remoendo a vergonha recente e se arrependendo de ter escrito a maldita carta, a menina concordou com a cabeça. Tirando a vergonha e o “amor” reprimido que ainda ficariam por algum tempo, estava tudo certo outra vez. Os dois saíram do esconderijo exatamente na hora em que uma música mais lenta começava a tocar. Ele sorriu, estendeu a mão, e encerrou a história daquela festa junina com um final quase feliz:
- Então... Quer dançar comigo?
Crônica publicada dia 5 de outubro na página 6 do jornal Diário de Notícias.
O piano (apócope derivado do italiano pianoforte) é um instrumento musical de cordas percutidas pelo sistema de classificação de Hornbostel-Sachs. O violino é um instrumento musical, classificado como instrumento de cordas friccionadas. É o mais agudo dos instrumentos de sua família (que ainda possui a viola, o violoncelo, correspondendo ao Soprano da voz humana. A Carol Grechi é um ser humano do sexo feminino, que já nasceu, está crescendo, ainda não se reproduziu e espera não morrer em breve. Estas três definições estarão unidas em um mesmo ambiente a partir desta sexta.
Não entendeu? Vou começar minhas aulas de piano e violino hoje. Já comprei uma caixa de cotonetes e tirei pó do meu “Guri Cachaça Van Bertollo Móica de Sulzbacher” (o violino pobre com nome de rico).
Por que diabos comprei um violino? A culpa é do Dazaranha, se alguém entrar em depressão ao me ouvir tocar (o que acontece frequentemente devido aos “ruídos” emitidos pelos iniciantes no instrumento) pode mandar a conta do otorrino pra Floripa. Fernando Sulzbacher, violinista do Daza há quase 20 anos, foi quem me inspirou a encarar o desafio.
Sempre pensei que violino fosse um instrumento caro, então nunca tinha me animado a comprar. Até o momento em que eu percebi que assim como existem violões de 100 reais, também existem violinos de 150 reais! Claro que não é um Stradivarius (ah vá!), que no caso é literalmente dez vezes mais caro, mas o meu dá pro gasto. Comprei sem nem saber o nome das partes do instrumento (tchê!). Resumindo, fiz cagada na hora de montar e quebrei meu cavalete. Pra quem não sabe, neste caso não estou falando daqueles cavaletes para pintura em tela e muito menos aqueles que ficam embaixo daquelas mesas de madeira toscas. No violino o cavalete é uma pecinha de madeira que suspende as cordas. Coloquei minha pecinha meio inclinada, meio torta... Aí fui apertando as cordas e... PLAAAAFT! Tava lá o corpo do cavalete estendido no chão, separado em dois pedaços.
Comecei a saga em busca de um novo. Quis dar um migué na loja e falei que simplesmente quebrou e não sei o que, tava na garantia e blá blá blá... Depois de 3 meses indo pentelhar o gerente quase diariamente, me mandaram dois cavaletes mais toscos que um tronco de árvore. Meu pobre amigo Fernando teve que me dar as coordenadas de como lixar e o caramba a quatro. Além de inspirar ainda tem que ensinar a pentelha! Pobre Fernando.
Fiz os ajustes mas fiquei com medo de colocar o cavalete e quebrar de novo. Aí aproveitando uma (rara) ida à Floripa, ganhei do meu inspirador dois cavaletes usados (pelo Daza, meu!!) e um jogo de cordas novas (demorei tanto pra resolver esse rolo que as cordas originais enferrujaram. Valeu Arroio).
Aí pronto. Afinadinho, certinho... SÓ tocar! Pra facilitar o meu lado, fui atrás do método Suzuki.Shinichi Suzuki era um velhinho japonês que começou a tocar com 17 anos e era amigo de ninguém menos que o Einstein. O japa criou um método para ensinar crianças, porque viu que os pequenos tinham uma baita facilidade em aprender. Espero que os meus 22 anos não importem pro Seu Suzuki.
Já sei tocar “brilha, brilha estrelinha”. Que repertório hein ô! Meu professor vai se orgulhar do talento da aluna já na primeira aula.
No piano quem me inspira é o Luciano Leães. O cara toca com: Acústicos e Valvulados, Locomotores, Fernando Noronha & Black Soul, Pública, às vezes toca com a Vera Loca e com mais algumas bandas de rock gaúcho. Lá tem bastante desse rodízio musical.
Em 2008 entrevistei o Leães e ele me disse o seguinte: “Lembro de ouvir os discos dos mestres do blues e ficar horas em frente ao piano, tentando tocar como eles; ouvia alguns álbuns e ficava desanimado, pensando que nunca ia conseguir chegar perto daquilo. Hoje sei que as dificuldades vão continuar sempre, pois isso é apenas uma variável que faz da música uma forma de expressão tão complexa e bonita. Foram anos até chegar a um nível que me deixou satisfeito”.
Penso nisso cada vez que ouço ele tocar e fico com cara de tacho olhando pro teclado na minha frente.
Como pessoa viciada que sou, sei que vou esfolar os dedos até quase chegar perto do que estou ouvindo. Espero não ficar sem dedos muito rápido.
Então era isso, té semana que vem! Ah, última dica: se quiser curtir um violino bem tocado ouve a versão ao vivo da música Tribo da Lua, do Dazaranha. E se quiser ler a entrevista completa que fiz com o Leães curte aqui. Té +
Mais uma vez comprovando a minha falta de memória para comigo mesma (ã?) esqueci de pegar a história da “Morte ao S”, que eu comentei na última crônica e que talvez publicasse na próxima (no caso esta). Ê bagunça!
Pensei em milhares de coisas, do meu vídeo-game Dynacon (aquele que vinha com uma arminha pra matar uns patos no joguinho) à minha fita de vídeo do filme do Máscara, que me encantava pelo simples fato de ser verde. Então decidi escrever sobre livros. É, nada a ver com os pensamentos anteriores.
O primeiro livro com mais de 100 páginas que li foi Harry Potter e a Pedra Filosofal, quando eu tinha 12 anos. Depois que me acostumei com os “tijolos” seguintes do Harry Potter (Cálice de fogo - 584 páginas, Ordem da Fênix – 704 páginas... e por aí vai) me desanimam os livros “finos”. Quando ganhei os HPs, eram os únicos livros que eu tinha. Literalmente não parei de ler. Pelas minhas contas foram mais ou menos 36 as vezes em que li a sequência dos 4 primeiros livros da série. É, me interna!
Um cara que eu gosto muito do texto e continuo lendo repetidas vezes é o colombiano Gabriel García Márquez. “Cem anos de solidão” pra mim é o melhor, mas “O amor nos tempos do cólera” e “Memórias de minhas putas tristes” também são demais. O texto dele parece tão natural, vai fluindo como se já fosse um velho amigo do meu par de olhos.
A trilogia “O tempo e o vento”, do Érico Veríssimo, também me marcou bastante. Achei os livros escondidinhos na então mirrada biblioteca da minha escola, lá no Arroio do Silva. Foi uma das melhores histórias que pesquei entre os infinitos livros da Barsa e as pilhas de gastos livros infantis. A trilogia começa com O Continente, depois O Retrato e O Arquipélago. Só em relembrar já me deu vontade de ler de novo. Muito massa!
Quando quero ler alguma coisa no estilo comédia romântica, vou pro livros da Marian Keyes: Melancia, Férias!, Sushi, Casório?!, É Agora... ou Nunca, Los Angeles, Um Best Seller pra Chamar de Meu, Tem Alguém Aí? e o tal Cheio de Charme que saiu ano passado e eu ainda não li. O Texto dela me dá vontade de escrever e justamente por isso acho que é um dos que mais influencia o meu. Outra autora que vai na mesma linha é a Meg Cabot, curto bastante os seis livros da série A Mediadora. E sim, vou para o inferno dos intelectuais porque já li a série Diário de Princesa, que também é dela.
Pra tentar levantar minha moral outra vez, posso ir pro lado do jornalismo literário e dizer que o Rota 66 do Caco Barcellos e o Hiroshima do John Hersey também estão entre os tops da lista. No texto de jornal curto bastante o estilo do David Coimbra e, não à toa, meu TCC foi sobre ele, mais precisamente sobre A influência da literatura no texto jornalístico. Recomendo a reportagem especial do David sobre as FARC, foi nela que baseei minha análise (ó, falei bonito!). Dá pra ler no Blog dele, assim como as crônicas, que também alimentam a minha inspiração.
A música é outra que me atrai na literatura, os dois livros do Duca Leindecker (Cidadão Quem/Pouca Vogal) estão na fila do repeteco lá na estante de casa: A casa da esquina e A favor do vento. Juntamente com o Pra ser sincero e o Mapas do Acaso do Humberto Gessinger. Outro massa é Os insones, do Toni Belotto.
Minha mais recente fonte de cobiça é um livro que fala sobre aquela série que eu gosto, e que me proibi de falar o nome nas crônicas pra não ficar chato. É O guia oficial de House (ops, falei), do Ian Jackman. Também a ficção O vendedor de armas, do Hugh Laurie. Até ia comprar pela internet, mas, com a greve dos carteiros sabe-se lá quando eu os veria em casa.
Aliás, comprei uma agenda toda bacanuda pra 2012, pela internet. Comprei um dia antes de começar a paralisação nos correios. Ê sorte! Hoje recebi o link pra rastrear a compra e ... Ainda está em Porto Alegre. ¬¬. Espero que chegue antes de janeiro.
Era isso, té semana que vem com a Morte ao S (se eu lembrar). Pra embalar o findi curte aí um trecho do Cem anos de Solidão:
“Muitos anos depois, diante do pelotão de fuzilamento, o Coronel Aureliano Buendía havia de recordar aquela tarde remota em que seu pai o levou para conhecer o gelo. Macondo era então uma aldeia de vinte casas de barro e taquara, construídas à margem de um rio de águas diáfanas que se precipitavam por um leito de pedras polidas, brancas e enormes como ovos pré-históricos. O mundo era tão recente que muitas coisas careciam de nome e para mencioná-las se precisava apontar com o dedo. Todos os anos, pelo mês de março, uma família de ciganos esfarrapados plantava a sua tenda perto da aldeia e, com um grande alvoroço de apitos e tambores, dava a conhecer os novos inventos. Primeiro trouxeram o ímã. Um cigano corpulento, de barba rude e mãos de pardal, que se apresentou com o nome de Melquíades, fez uma truculenta demonstração pública daquilo que ele mesmo chamava de a oitava maravilha dos sábios alquimistas da Macedônia. Foi de casa em casa arrastando dois lingotes metálicos, e todo o mundo se espantou ao ver que os caldeirões, os tachos, as tenazes e os fogareiros caíam do lugar, e as madeiras estalavam com o desespero dos pregos e dos parafusos tentando se desencravar, e até os objetos perdidos há muito tempo apareciam onde mais tinham sido procurados, e se arrastavam em debandada turbulenta atrás dos ferros mágicos de Melquíades. "As coisas têm vida própria", apregoava o cigano com áspero sotaque, "tudo é questão de despertar a sua alma." José Arcadio Buendía, cuja desatada imaginação ia sempre mais longe que o engenho da natureza, e até mesmo além do milagre e da magia, pensou que era possível se servir daquela invenção inútil para desentranhar o ouro da terra. Melquíades, que era um homem honrado, preveniu-o: "Para isso não serve." Mas José Arcadio Buendía não acreditava, naquele tempo, na honradez dos ciganos, de modo que trocou o seu jumento e um rebanho de cabritos pelos dois lingotes imantados”
Crônica publicada dia 23/09/2001 na página 6 do jornal Diário de Notícias.
Como é difícil achar 1/4 novo pra descansar os pensamentos. Estou procurando um apartamento pra alugar, que seja perto do jornal, barato, só pra mim e que tenha pelo menos um fogão e uma geladeira dentro. Não tá fácil!Quando tem uma coisa não tem outra e quando tem a maioria dos itens, é longe (aí vou ter que sustentar a ACTU com meus R$ 5,60 diários... Eu hein). O porquê do “só pra mim”? Sei lá... Queria saber como é andar pelada pela casa. Rá – rá – rá, brincadeirinha. Não, na real queria ter um canto pra deixar meu teclado sempre a postos, o violão pertinho, o violino mais pertinho ainda... Fazer um som (nem que seja um som ruim pra caramba) na hora em que me der vontade. Ver minhas maratonas daquele seriado (prometi pra mim mesma que não usaria a palavra House outra vez nas crônicas pra não ficar chato) na hora em que desse na telha. E... Sei lá, no mais seria “brincar de casinha”, deixar ela bem bonitinha e poder chamar aquele canto de “meu”.
Inevitavelmente lembrei de quando fiquei um tempo morando na pacata cidade de Jacinto Machado. Não conhece a cidade? Apresento-lhe então, com um trecho de outra crônica que escrevi enquanto estava lá. Curte:
23/03/2011 - “Se eu achava que o Arroio era interior é porque eu não havia morado aqui ainda. Legal foi no feriado de carnaval, eu não almocei porque os dois únicos restaurantes do “centrinho” da cidade estavam fechados. Padarias tbm. Ao meio dia, uma hora, nada. Niente. Nothing. Pra casa comer bolacha com leite. Baita carnaval!!!
Funerária aqui tem bastante, e sempre de plantão. Tranquilo pra dar uma morridinha. Farmácia também, sempre tem uma aberta e sempre tem mais uma abrindo. Tem uma locadora com Lan House que deve ter pago as contas do mês só com as minhas contribuições quase diárias. Pra esquecer que estou sozinha e a km de alguém querido, pego filmes. Inclusive os que já vi. A Origem e Sherlock Holmes estão na lista do replay. A Lan House é reconfortante. Não porque falo com a mãe ou com o namorado, com ela falo por fone e vejo no findi, ele vejo na facul e no outro findi. A internet é mais pra sentir que ali eu conheço a área. Facebook, meu quase falecido Orkut, Twitter, Gmail, Hotmail, e a ronda de sempre nos sites do Dazaranha e do Pouca Vogal pra cuidar a agenda.
Ônibus é uma tristeza. Horários mais escassos do que cabelo na cabeça do Homer Simpson. Semana passada tive que pegar um ônibus pra Araranguá, pra depois pegar pra Criciúma, pra chegar mais cedo na facul. FUNÇÃO! Bota função nisso... (Se um dia eu passar na prova de carro da auto-escola eu compro um carro em 12345 vezes. Mas isso merece outra crônica)”
Ah, é mesmo... Esqueci de fazer outra crônica pra contar a saga da auto-escola. Esqueci também que na crônica da semana passada eu tinha dito que escreveria na próxima sobre “as histórias sem fim de quem a gente não conhece”. Pensei nisso quando passei na rodoviária. Enquanto espero o ônibus gosto de ficar imaginando pra onde irão e de onde vem as pessoas que também estão ali esperando. Por que estão indo pra lá e pra fazer o que... Na verdade não teria mais graça se eu soubesse mesmo. O legal é olhar aquela tia lá, sentada com as sacolas de mercado aos pés, e imaginar que o nome dela é Jurema (que nem aquela marca de ervilhas) e que ela acabou de ganhar na mega-sena e está andando de ônibus e com sacolas de mercado pra fingir que ainda é pobre. Tá certa a dona Jurema, vai que ela é seqüestrada né?
Ao lado dela tem um rapaz com fones de ouvido, casacão de couro e cabelo punk. Pra mim o nome dele é Astrogildo e ele está ouvindo uma coletânea com as 20 melhores da Kelly Key (se é que isso é musicalmente possível).
Lembrei de um cobrador que faz a linha dos amarelinhos. Ele parece o Tropeço da Família Adams. E está sempre triste. Tão triste que não consigo imaginar uma história bizarra pra ele.
Já que a crônica hoje ta toda revirada, com mais assuntos que reunião de clube de mães (ô mais falam!), também acabei de pensar se eu me encontraria fazendo cinema. Transformar todas as histórias sem fim das pessoas que eu não conheço em roteiros com fim e com histórias bizarras. Acho que meus filmes teriam dois acessos no Youtube, o meu e o da mãe.
Estou lembrando de várias coisas hoje enquanto escrevo a crônica. Hoje eu quero dizer ontem. Porque não vou fingir que estou escrevendo na quinta só porque você está lendo na quinta (oh não, agora vou pro inferno dos jornalistas!).
Lembrei que comecei a escrever uma história sobre uma banda chamada “Morte ao S”. Escrevi tudo sem a letra S. Quando chegar em “casa” hoje vou escrever mais um pouco (a idéia era virar um livro ¬¬) e semana que vem (se o chefe permitir tamanha liberdade) publico um pouco da Morte ao S aqui. Çe prepare pra ver a letra cedilha muitaç vezeç.
Era isso. A crônica de hoje não é uma história, mas também vai ficar meio sem fim. T + .
Crônica publicada dia 15/09/2001 na página 6 do jornal Diário de Notícias.
Quantas pessoas passam por nossas vidas, convivem conosco por um bom tempo e depois somem? Não, não se preocupe porque não vou filosofar sobre o desapego humano e muito menos sobre aquele filme que passa na Sessão da Tarde desde que eu tinha sete anos. Aliás, podemos começar por lá.
Quando eu tinha sete anos morava no Rio Grande do Sul e tinha quatro vizinhos com quem eu brincava. A Kelly, que me chamava de Carolina (eu ainda não dava bola quando erravam o meu nome) e era uma caricatura ambulante da Olívia palito, além de possuir uma impressionante capacidade de gritar enquanto brincava com qualquer coisa. O Luan, irmão mais novo dela, que estragava nossas brincadeiras como todo irmão mais novo deve fazer.
A Pâmela, que era mais velha do que nós duas e estava na fase pré-adolescente encarnada nos “Pies descalzos” da Shakira. E por último tínhamos o Matheus, uns três anos mais novo do que eu. Passávamos mais tempo na casa da avó dele brincando de Barbie, (na real ele brincava com uma Susi herdada da tia dele) desenhando Brancas de Neve com lápis de cor e fazendo comidinha, do que em qualquer outro lugar.
Engraçado, com a Kelly eu me ralava subindo em árvores, brincando de polícia e bandido, dublando os Mamonas Assassinas... E com o Matheus eu desenhava contos de fada e brincava de “cozinhar” folhas de árvore com punhados de arroz cru.
Me mudei para SC quando tinha nove anos. Fiz outros amiguinhos que também já não sei onde foram parar... E agora eu me pergunto: Como estarão aquelas quatro pessoas? Não tenho a imagem de uma Kelly na minha idade atual, não imagino a Pâmela sem suas calças ripongas, o Luan sem sua pancinha e seu nariz ranhento e o Matheus sem sua Susi.
Falta a continuação da história. É claro que só dei um exemplo, eu poderia listar as outras inúmeras pessoas que fizeram parte da minha vida por algum tempo e depois viraram só lembrança. Aposto que você que está lendo aí já lembrou de alguém que ficou na sua cabeça com uma história sem fim.
Tentei procurar alguns deles na internet, mas, mesmo que eu encontrasse o que eu iria dizer? “oi, lembra aquela vizinha gordinha que vivia caindo de Roller e brincando contigo? Pois é, sou eu. Como vai a vida?”. Seria bizarro, a pessoa ia ter que fazer um levantamento dos últimos 15 anos ou então fazer um resumão e dizer apenas “ por aqui tudo bem”. O que não serviria em nada pra matar minha curiosidade. Já perdemos a ligação, não tem mais graça.
Acho que é mais legal guardar uma lembrança de amizade do que forçar uma falsa cumplicidade depois que duas pessoas já não tem mais nada a ver.
Se alguma pessoa com quem eu convivi por acaso ler isto e ficar curiosa sobre a continuação da minha história, lá vai o resumão: faz tempo que não caio e ralo os joelhos (até mesmo porque faz tempo que não subo em árvores, ando de Roller, bicicleta, brinco de pega-pega, etc..), Continuo sem irmãos, continuo gostando de desenhar, brincar de Lego, imaginar a história das pessoas (não diga!), cantar, ver filmes por horas e horas (o Dr. House que o diga), e continuo sendo a mesma Caroline dos meus sete anos. Apenas com dentes permanentes, um pouco mais alta e ainda um pouco acima do peso.
Continuei sendo uma boa aluna (saí daí ô... Cdf), aprendi a tocar violão, ainda não aprendi a tocar teclado e violino, me formei no segundo Grau, entrei pra faculdade de jornalismo, me formei mês passado, estou morando e trabalhando em Criciúma e namorando há quase três anos. Resumir 15 anos em 10 linhas até que é legal. Quem não me conhece agora acha que me conhece.
Aliás, quinta-feira que vem já sei sobre o que vou escrever. As histórias sem fim de quem a gente não conhece. Como assim? Sei lá, tenho uma semana pra pensar. Então, até mais! O barulho da chuva lá fora me diz que estou atrasada pra me encontrar com um balde de pipoca, uma cama fofinha, e com o Hugh Laurie para mais uma incansável maratona House. Ó vida cruel.
Crônica publicada dia 08/09/2001 na página 6 do jornalDiário de Notícias.